Mobilidade elétrica: O papel da CME na transição energética

Mobilidade elétrica: O papel da CME na transição energética

2025-07-10

A revista “o electricista” entrevistou, para o espaço APIEE, Leonel Nogueira, responsável pela área de mobilidade elétrica na CME, para falar sobre os desafios e oportunidades que se colocam ao setor. Uma conversa que destaca a visão da CME enquanto parceiro tecnológico e energético na construção de um futuro mais sustentável.

Tendo a presente edição da Revista por mote a “automação residencial, comercial e industrial” e ainda sob o efeito do apagão ocorrido no passado dia 28 de abril, esta entrevista dedica-se à questão da mobilidade elétrica, um eixo fundamental para a transição energética que se encontra em curso.

João Rodrigues, Diretor Executivo da APIEE, começa por referir “Da minha parte, estou totalmente convicto que as iniciativas ligadas à automação residencial, comercial e industrial são um importante contributo para o aumento da eficiência operacional de qualquer infraestrutura e por isso assumo-me como um defensor da sua utilização.

Em simultâneo, estou também convicto que a transição energética, para além de beneficiar das iniciativas ligadas à eficiência operacional e à eficiência energética, será alcançada através do somatório de múltiplos contributos e de múltiplas tecnologias, tais como a mobilidade elétrica, a produção descentralizada de energia elétrica renovável, a utilização de gases renováveis, a digitalização em alta escala de todas as instalações, apenas para citar alguns exemplos.

É, pois, por isso, que dedicaremos esta entrevista ao tema da mobilidade elétrica, para a qual convidei o Leonel Nogueira, Responsável do Departamento de Mobilidade Elétrica, do nosso associado CME.”


ENTREVISTA

João Rodrigues (JR): Caro Leonel, agradecendo a sua disponibilidade para a realização desta entrevista. Peço que comece por apresentar a CME.

Leonel Nogueira (LN): A CME é uma empresa de engenharia e soluções tecnológicas com mais de 40 anos de experiência e uma forte presença nacional e internacional. Integrada no Grupo ProCME, atua em áreas como eletricidade, energias renováveis (eletricidade verde e gases renováveis), telecomunicações, mobilidade elétrica e eficiência energética.
A nossa visão estratégica para 2025 e anos seguintes passa por liderar a transição energética, desenvolvendo soluções que combinem sustentabilidade, inovação e criação de valor para os nossos clientes.

JR: A forma como consumimos e produzimos energia está em profunda mudança. A recente experiência do apagão reforça a consciencialização de que a energia é um fator fundamental para a nossa sociedade. Como é que uma empresa como a CME encara estas alterações?

LN: Encaramos esta mudança como uma oportunidade para reforçarmos o nosso papel enquanto parceiro estratégico na transição energética.
Afirmamo-nos como uma empresa de engenharia altamente qualificada e multidisciplinar, com competências técnicas e operacionais nas diferentes frentes desta transição. Não somos meros executantes. Hoje, concebemos, integramos e operamos soluções completas, com forte incorporação de engenharia, tecnologia e inovação.
Estamos presentes ao longo de toda a cadeia de valor da energia. Temos equipas especializadas que cruzam competências em eletricidade, telecomunicações, energia renovável, ambiente, redes inteligentes, automação e engenharia, o que nos permite responder de forma integrada, ágil e sustentável aos novos desafios energéticos.

JR: Sendo o dossier desta edição de “o electricista” dedicado a “automação residencial, comercial e industrial”, áreas com grande proximidade às questões ligadas à utilização das novas tecnologias, pergunto agora sobre quais as tendências principais que a CME observa?

LN: Entre as principais tendências que acompanhamos de perto, destacamos: a descarbonização e transição energética, descentralização e participação ativa dos consumidores na produção de energia, digitalização e automação e a resiliência das infraestruturas, já que eventos como o apagão, por exemplo, tornam clara a necessidade de redes mais robustas e flexíveis.
É a esta realidade que estamos atentos, desenvolvendo soluções que combinam tecnologia, engenharia e compromisso ambiental, com destaque para a eletrificação dos consumos, a mobilidade elétrica, os gases renováveis e a eficiência energética. Estas soluções integradas e inteligentes permitem otimizar recursos e garantir uma maior sustentabilidade. É nestes pressupostos que trabalhamos, diariamente, para oferecer aos nossos clientes soluções tão diversas como o nosso camião elétrico autónomo para intralogística - ATLoS, uma solução integrada de carregamento de VE com software de gestão.
Para além disso, integrámos a realidade virtual nalgumas das nossas atividades e fomos uma das 7 empresas selecionadas no primeiro leilão de compra centralizada de gases renováveis em Portugal. Estas tendências não são apenas sinais do futuro. São já o nosso presente.

JR: Tendo-se falado de mobilidade elétrica, proponho exploramos um pouco mais esse eixo. Qual a visão da CME para a mobilidade elétrica?

LN: A visão da CME para a mobilidade elétrica assenta na integração inteligente entre mobilidade, energia renovável e digitalização. O país tem um elevado potencial graças à forte penetração de solar e eólica, que, combinadas com o carregamento inteligente, podem tornar os veículos elétricos uma ferramenta ativa na gestão da rede elétrica. A conjugação de carregadores AC/DC, com sistemas de produção fotovoltaica e armazenamento descentralizado, permitirá reduzir picos de consumo e tornar o sistema mais eficiente e económico.
No entanto, há certos bloqueios a ultrapassar. Em Portugal, o modelo centralizado da Mobi.E, muito importante numa fase inicial e que permitiu alavancar bastante a entrada dos veículos elétricos, hoje limita a inovação e a entrada de novos operadores, os quais poderiam permitir que o custo de carregamento público se tornasse mais competitivo.
Consideramos que deveria ser reservado o papel da Mobi.E para uma função mais reguladora e menos interventiva e que é essencial flexibilizar o licenciamento das infraestruturas elétricas e promover o autoconsumo com carregamento local.
Em conclusão, pensamos que só com um mercado mais aberto e ágil será possível concretizar o verdadeiro potencial da mobilidade elétrica e posicionar Portugal como líder na transição energética.

JR: Quais as expectativas que identificam nos clientes?

LN: As expectativas dos clientes na área da mobilidade elétrica estão a evoluir rapidamente.
Já não procuram apenas alguém que “instale um carregador”, mas sim um parceiro que compreenda o seu contexto energético e ofereça uma solução integrada, eficiente e futura.
Esperam um serviço completo: desde o dimensionamento da potência, integração com produção solar (e armazenamento), manutenção da infraestrutura, monitorização e até ao controlo remoto.
A CME tem desenvolvido muitos projetos de concessão e construção em que o cliente chega e questiona: “vou eletrificar a frota e pretendo colocar carregadores na empresa e possibilitar que os meus colaboradores carreguem os seus veículos. O que devo fazer?”. Neste novo cenário, deixamos de ser apenas um instalador e passamos a assumir o papel de consultor energético e tecnológico. Articulamos as várias tecnologias disponíveis – carregadores AC/DC, gestão inteligente de energia, autoconsumo, baterias – para conceber soluções ajustadas às necessidades de cada cliente, seja doméstico, empresarial ou público. 
Esta transformação exige novas competências, mas também representa uma enorme oportunidade para diferenciar serviços, fidelizar clientes e contribuir ativamente para a transição energética.

JR: Preservando a informação que seja naturalmente confidencial, pode partilhar alguns casos de sucesso?

LN: Temos vários projetos de que nos orgulhamos, mas destacamos dois que refletem bem a nossa capacidade de entregar soluções completas, integradas e com impacto real no avanço da mobilidade elétrica em Portugal.
O primeiro é a parceria com a BMW, que já resultou na instalação de mais de 6000 carregadores em todo o território nacional, incluindo as regiões autónomas. Esta operação inclui a eletrificação da rede de concessionários, com a instalação de carregadores rápidos DC, essenciais para as necessidades operacionais das marcas premium. Para além disso, temos vindo a instalar postos BMW Destination Charging em locais estratégicos como hotéis, restaurantes e espaços turísticos, promovendo a mobilidade elétrica entre os clientes BMW.
Outro caso de sucesso é o projeto desenvolvido para a Águas e Energia do Porto, onde executámos uma solução chave-na-mão, que incluiu o dimensionamento elétrico, o projeto técnico, a instalação das infraestruturas e dos carregadores, bem como a integração de uma plataforma de gestão. Esta
plataforma permite o controlo remoto e otimizado dos vários pontos de carregamento, distribuídos por diversas instalações da empresa, garantindo eficiência energética, gestão centralizada e adaptação às necessidades operacionais de uma entidade com grande exigência técnica e responsabilidade ambiental. 
Estes são apenas dois exemplos, entre muitos outros. Graças às fortes parcerias que mantemos com várias marcas automóveis, entidades públicas e privadas, temos desenvolvido e implementado soluções em todo o país, sempre com um foco claro: integrar tecnologia, sustentabilidade e eficiência ao serviço da mobilidade elétrica.

JR: O que consideram ser necessário alterar e/ou melhorar para que este mercado tenha um ainda maior desenvolvimento?... ou consideram que tudo já está conforme as necessidades?

LN: Apesar dos progressos alcançados, acreditamos que ainda há espaço para melhorias importantes no setor da mobilidade elétrica.
É essencial simplificar e acelerar os processos de licenciamento e ligação à rede, que continuam a ser um entrave para muitos projetos. Também consideramos necessário rever o modelo da Mobi.E, promovendo mais flexibilidade e concorrência, para permitir inovação e integração com soluções energéticas (como, por exemplo, o autoconsumo). Além disso, é fundamental investir na formação técnica dos profissionais, dado que a mobilidade elétrica exige cada vez mais competências em energia e digitalização. Por fim, deve haver um maior alinhamento entre os incentivos à mobilidade elétrica e à produção descentralizada de energia renovável, para potenciar soluções locais e sustentáveis.

JR: E então, antes de terminar… quais os principais bloqueios e/ou desafios?

LN: Gostaríamos de destacar alguns dos principais bloqueios e desafios que enfrentamos no desenvolvimento deste mercado tão tecnológico e em rápida evolução.
Um dos maiores desafios é a falta de mão de obra qualificada, dado que a mobilidade elétrica exige competências técnicas avançadas, que vão desde o conhecimento dos sistemas elétricos tradicionais até à integração de soluções digitais e energéticas mais complexas. Por isso, mantemos um diálogo constante
com fabricantes/fornecedores para acompanhar as inovações e garantir que os nossos técnicos estão sempre atualizados. Essa necessidade de formação e qualificação contínua dos profissionais é crítica, pois o setor está em permanente transformação e exige um perfil técnico-consultivo capaz de propor soluções integradas e eficientes.
O nosso foco é alertarmos os clientes que não podem tomar decisões exclusivamente baseadas no fator preço ou de curto prazo, sob o risco de comprometerem as suas próprias ambições de sustentabilidade, eficiência e fiabilidade.
Investir em qualidade, inovação e conhecimento é fundamental para assegurar que as infraestruturas de mobilidade elétrica cumpram o seu papel no futuro energético.

JR: Agradeço a sua disponibilidade para partilhar a vossa visão e as vossas experiências com os leitores de “o electricista”.

LN: Em meu nome e em nome da CME, gostaria de expressar o nosso sincero agradecimento pela oportunidade de participar nesta entrevista. É muito importante poder partilhar a nossa visão, experiências e contributos para o desenvolvimento da mobilidade elétrica em Portugal. Acreditamos que o diálogo aberto e construtivo é fundamental para superar desafios e potenciar as oportunidades deste mercado em crescimento. É por isso que estamos empenhados em continuar a colaborar com todos os atores do setor para construir um futuro mais sustentável e inovador.

Leia a entrevista na revista “o electricista”.

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